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O JORNALISTA CARLOS

         Ele já não podia esconder que Rosa lhe chamava a atenção. A sua oportunidade surgiu em um dia chuvoso em que saia da redação do jornal em que trabalhava. Rosa também fazia horas por lá. Ela tinha os olhos verdes, e foi a primeira coisa que o jornalista percebera. Em pleno verão, a chuva começou fraca às cinco horas da tarde, estaria acabado o fim de semana na praia. Mas para o jornalista Carlos não fazia muita diferença, pois não era chegado a programas em público. Preferia ficar em casa, e da sua janela ver os passantes do calçadão. Era um homem solitário, sem amigos, sem cão, sem nada. E quando às seis e meia da tarde a chuva já quase perfurava o asfalto de tão forte, ele abriu o seu guarda-chuva preto, viu que rosa tentava abrigar-se embaixo de um capote muito fino. Não havia táxi por perto, ele na verdade não precisava, morava a apenas dois quarteirões dali. Mas não Rosa, ela morava longe. E se perguntou onde estaria o seu carro. Em um impulso ofereceu abrigo em seu guarda-chuva. Ela não teve como recusar.

          - Onde está o seu carro? – perguntou já com metade da camisa encharcada.

          - No mecânico! Onde mais poderia estar... – parecia simpática. Conhecia Carlos de um modo amistoso, sem muita aproximação.

          - Você pode me acompanhar até em casa e lá você pede um táxi. – a idéia foi bem vinda e bem aceita. Os dois caminharam pelos quarteirões que separavam o Jornal da casa de Carlos. No caminho conversas insossas de pessoas que não se conheciam bem surgiram. Coisas como o tempo, crises econômicas e o famigerado aquecimento global. Para Carlos a voz de Rosa parecia diferente, como se nunca tivesse ouvido antes. Perguntava-se se não teria idealizado a jornalista, o que caracterizava um caso clássico de amor platônico. Essa era história de sua vida. Amores platônicos e sem muito futuro. Riram de uma ou duas coisas. Coisas com pouca graça, corriqueiras.

          Ao destrancar a porta, Carlos se perguntou o que estaria fazendo. Nunca trouxera uma mulher em seu apartamento. Não com segundas intenções. Outras mulheres já tinham ido a seu lar ridiculamente organizado para um ser solteiro do sexo masculino. Rosa enxugou-se em uma toalha prontamente apanhada por Carlos. Ele tentou disfarçar e tentou não olhar para Rosa enxugando a roupa e o corpo. Estava nervoso. Mas sentiu que era hora. Não tinha por que esconder mais. Ouviu em sua cabeça algo dizer: “Vai Carlos! É agora ou nunca!”

          - Estou apaixonado por você. – Declarou-se de forma seca e ficou branco como cera, com olhar de cachorro pidão, como se implorasse por alguma coisa. Rosa ficou sem jeito, tentou desconversar, tentou usar mil argumentos. O que ela dizia parecia insuportável de se ouvir. Pelo menos para Carlos. Não demorou muito para Rosa se desfazer da situação. Acertaram os ponteiros, estava tudo certo. Carlos continuaria com o seu amor platônico e Rosa seguiria a sua vida.

          Despediram-se formalmente ao chegar o táxi. Agora descia pelo elevador o seu amor de alguns meses. Como de praxe, não correspondido. Foi-se Rosa no táxi, mas agora fazia sol. Ao sentar-se em frente à janela, e não passados mais que dez minutos, avistou uma passante que já lhe era familiar. Percebeu que algo acontecia em sua mente. Aquilo tudo de novo. Carlos era um verdadeiro caçador de amores platônicos. E quando se deu conta, começou a chuviscar novamente e tinha uma arma em suas mãos. Ele sabia o que tinha que fazer. E quando o seu dedo indicador apertou o gatilho, não havia mais amores platônicos, apenas uma escuridão. Nada diferente de onde sempre tinha vivido.


                                                                                                                 Wilson Macêdo Jr.