VISITANTES

NA AREIA (Wilson Macêdo Jr.)




Os raios do sol me açoitam com farpas ultravioletas.
Meu corpo inerte toma de um gole de cansaço e tomba,
E se perde na cândida praia sem cão nadador e atleta.

Como se eu fosse parte da areia e sua essência,
Formigam minhas vísceras que agora parecem externas,
A praia transfigura-se em cinza e agora quem castiga é a chuva.

Nesse misto de areia e água forma-se lama de desespero,
Uma argamassa amarga e pronta para edificar o meu corpo.
E deixo que na próxima onda o que restou
se esvaia a galope torpe fora de mim.

Hipnose,
Sonolência,
Letargia.
Sinônimos do meu fim.

O CÃO DA MADRUGADA (Wilson Macêdo Jr.)




Um cão correu e seu rastro iluminou a madrugada.
Não sei se era cão vadio ou de pura raça.

O mesmo cão me olhou e parecia estar atrapalhado.
Não ousei perguntar se tinha dono ou se era alforriado.

Ao primeiro passo dado em sua direção, moveu-se pra trás.
Não insisti em manter contato, preferi contemplá-lo mais.

Estiquei minha mão no impulso de levemente tocá-lo.
O cão mostrou os dentes e postou-se ligeiramente desconfiado.

Senti no seu o olhar que tínhamos algo em comum então.
Éramos dois espectros presos na madrugada e soltos na solidão.

Finquei um joelho no chão para ficar à sua altura.
O cão deu um passo atrás e na sombra escondeu sua figura.

Um assovio me pareceu não mais que um ato prudente.
Não sei o que o cão sentiu, mas aproximou-se ternamente.

Mantinha o seu olhar fixo no temeroso olhar meu.
Cautelosamente minha mão pelo seu pêlo correu.

O cão deitou-se e agora parecia menos ameaçador.
Mesmo na madrugada fria minha mão compartilhou o calor.

Sorri e ficamos em uníssono naquele eterno minuto.
Meu toque para aquele cão não se caracterizava mais insulto.

Levantei-me, olhei o cão pela última vez, e na madrugada parti.
Decidi não olhar pra trás, e assim sem pensar apenas segui.

Ao meu lado o animal balançava o rabo e seguia em sua passada.
Éramos dois. Eu e o cão, perdidos e sós na fria madrugada.

ALÉM DO FIRMAMENTO (Wilson Macêdo Jr.)




Surgiram cinco estrelas quando o céu estava nublado.
O meu cenho franziu curioso a tal caso antes pra mim raro.
E como se a natureza assim desafiasse o meu estranhamento,
Mais cinco pontos brilhantes estamparam a noite acabrunhada.

Na minha ciência particular tal fato era impensável.
De acordo com minha firme certeza era mau pressentimento.
Mas meus olhos se encantaram com o simples fato
De uma estrela brilhar numa noite nublada além do firmamento.

A SEREIA (Wilson Macêdo Jr.)


Conto gotas de uma chuva ácida
que fere o chão e liquida pássaros.
Meu corpo não resiste a tal banho
e em um milhão de canções me desfaço.

Talvez o que saia do mar seja uma sereia
para acariciar o meu corpo naufragante.
E no mesmo banho há um beijo marítimo
compartilhado pela sereia que sorri e canta.

Deixo que ela me guie pelas ondas espumantes,
Deixo que ela abra as trilhas secretas e salinas,
Recorro ao desejo de tornar-me cara pérola,
Deixo que a sereia me envolva em folclore e morte.