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PRAIA SOLITÁRIA (Wilson Macêdo Jr.)




Restam nos meus pés calos das caminhadas.
Sim, haviam pedras de nomes santificados,
Haviam gemas danificadas, soluços cravejados,
Havia calor, chuva, havia então o mar.

Havia canto doce das sereias afogadas,
Algas sem cor pelas areias esparramadas,
Haviam canções que não podiam ser cantadas,
Havia chuva, havia o mar e então calor.

Havia um cão correndo e banhando-se nas águas,
O seu lento dono corria e não lhe alcançava,
Um anzol sereno ansioso nas areias descansava,
Havia linha, haviam iscas, não havia pescador.

E de tudo o que vi naquela manhã abandonada,
Havia um mar morrendo em sua matutina retomada,
Passos na areia que a deixava desfigurada,
Havia tristeza, havia solidão, não havia amor.

ISCA DE LEÃO (Wilson Macêdo Jr. )




Mato a cada dia um leão em mim.
Devoro sua carne com lágrimas ácidas,
Gotejadas, sem som, sem lástimas.

Esse leão que ruge e a mim não deglute,
É assolado por risos e patifarias
ditas à praça, às ruas enlameadas, ao vão.

Suas garras afiadas de fino corte rasgante,
Não tocam minhas entranhas calejadas,
É mais um tentar devorar que conseguir.

Mato esse leão enfurecido e desperto,
A cada passo em seguimento à aurora
que me desperta, que me faz viver e sorrir.

O BEIJO (Wilson Macêdo Jr.)




Ah... doce morte que me vem
como alento, correntes partidas,
rio interrompido, mar secante.

Como são frios seus braços
de anúncio do nunca mais,
aqui, nunca mais, os laços.

Parto. Não sofro. Suspiro.
Desiguais são as verdades.
E o que isso é? Verdade?

Tomara que seja assim,
que o beijo frio que me anseia,
que tanto me deseja... seja o fim.

O CASARÃO (Wilson Macêdo Jr.)



Ah se os pés que aqui pisam
chorassem sem saber porquê.
Haveriam lágrimas no chão,
Haveria suspiros desconhecidos.

Quanta verdade esparramada,
Nada aqui habita em segredo.
Nem o pueril passado de largas
passadas que deixam marcas.

Há uma taça de vinho derramada,
Uma mancha rósea no assoalho,
Restos de um jantar não deglutido,
Há desgraça, há sólida desolação.

Há um piano de teclas amareladas,
Uma marca de mão em sua tampa,
Há o som de uma música clássica,
Que nunca morre e nunca se cala.

Os ácaros devoram o que foi vida,
O teto destruído ilumina a escuridão.
Há um bichano no canto cochilando,
Há um ronronar de bicho e solidão.

E na elevação da escadaria de cedro,
Um vestido de festa descansa mofado,
E minhas mãos tocam a vestimenta,
que o tempo cuidou de desfazer a graça.

O úmido passado aqui é habitante.
E no ruído do fechar da porta principal,
O que fica é nada sem nada acontecer,
Só a lamúria aqui há de florescer.